terça-feira, 23 de setembro de 2008

O descoincidir
























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A quem senão a ti direi
como estou triste? Mas se a tristeza vem
de tu não estares, como ta direi, como hei-
de juntar o que me está doendo ao ven-
to que não bate mais à tua porta? Eu sei

que a tristeza é só isto, é só isto,
o descoincidir consigo mesmo, eu sei,
descoincidir com os outros, estava previsto
porque dentro de si o mundo não coincide e
não há senão tristeza. Em cada um está Cristo

sempre abandonado, cada um abandonado
a si mesmo, sem princípio e sem fim,
pois no princípio o amor era dado
promessa de te ter sempre junto a mim
não ausência, nem dor, nem habitado

ser por todo este absurdo. Morrer
um pouco, disse, sem saber o que dizia
pois eram só palavras, como se a prometer
tudo aquilo que havia e não havia.

Não haver palavras és tu a desaparecer.



Bernardo Pinto de Almeida
Abandono de Hotel Spleen, Quetzal 2003
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5 comentários:

  1. A incoincidência como fundamento da tristeza. Um belo texto de um
    autor que só recentemente descobri
    e que logo quis integrar num projecto meu, lamentavelmente uma
    das suas editoras - não a "Quetzal", claro! - achou mais delicado nem sequer me responder.
    Essa, talvez nova, estratégia de
    marketing não afectou a minha admiração por esta escrita.
    Belo poema!!!
    Grande abraço.

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  2. o descoincidir é terrível mas, o recoincidir dá muito prazer...

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  3. "Não haver palavras és tu a desaparecer"

    Incrivel a verdade que aqui está!

    Bj para ti

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  4. Sempre que aqui passo é com emoção que saio.

    Pelas palvras, pelas imagens, pela música, pela cor.

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