Cagarras e Calhandras são espécies em vias de extinção.
Crédito: D.R.
http://www.africatodayonline.com/index.php?p=noticia&i=946
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Entre 05 e 20 de Outubro deste ano, mais de doze mil cagarras-de-Cabo Verde, foram mortas.
A denúncia parte da associação ambientalista Biosfera I, da ilha de S. Vicente, que esta semana apresentou na capital do país, Cidade da Praia, uma exposição sobre o atentado ambientalista que se repete todos os anos.Segundo o presidente da associação, desde a década de 40 que a história se repete: no ilhéu Raso, onde vive 75 por cento da população mundial da cagarra-de-Cabo-Verde (Calonectris edwardsii), os populares matam milhares de crias na altura em que estão prestes a sair do ninho."Há três anos mataram entre 30 a 35 mil cagarras, no ano passado mataram no ilhéu Raso 27 mil crias, este ano não chegou a 13.000", disse à Agência Lusa José Melo, técnico de pesca, ambientalista e presidente da Biosfera I.A diminuição da mortandade não se deve a uma maior consciência ambiental, frisou José Melo, explicando que ela é apenas consequência de uma diminuição assustadora da população de cagarras-de-Cabo Verde, que actualmente não chega a 15 mil exemplares."A cagarra só põe um ovo, em Junho. A cria nasce no mês de Julho e é alimentada pelos progenitores até Outubro. É nessa altura, em duas semanas, que os pescadores apanham milhares de crias", contou.A exposição não foi visitada por qualquer responsável do governo de Cabo Verde, embora tenha sido precisamente este executivo que integrou o ilhéu Raso, em 2003, por decreto-lei, na Reserva Natural Integral de Santa Luzia e Ilhéus.Apesar da classificação como área protegida, por lei, o executivo nunca protegeu, até hoje, as cagarras, nem impediu a morte de milhares destas aves todos os anos, acusou José Melo, acrescentando que não é por desconhecimento da situação, porque a Biosfera I tem alertado com frequência para o problema, inclusivamente num encontro com o próprio primeiro-ministro, José Maria Neves."Em termos de legislação a cagarra está protegida. O ilhéu Raso faz parte da reserva natural e Cabo Verde tem assinado protocolos de protecção das espécies endémicas. Em termos de lei, temos tudo mas não há, literalmente, nenhuma protecção", lamentou.Na exposição, a Biosfera I apresenta um vídeo no qual se vê pescadores a apanharem as crias, a torcerem-lhe o pescoço e grandes montes de penas e cagarras mortas.Quer José Melo, quer Tommy Melo, biólogo, não entendem como é possível esta matança anual numa ilha protegida, especialmente porque as condições geográficas do ilhéu apenas permitem um local para se aportar, o que facilitaria a fiscalização.Como nada foi feito até agora, José Melo e Tommy Melo temem que, se a matança continuar, as cagarras do ilhéu Raso vão acabar em três anos. Mas o desprezo pelo ambiente tem outras consequências, alertam: com o fim das cagarras acaba também a espécie de lagarto que existe na ilha, única no mundo, que se alimenta dos excrementos das aves e dos insectos que eles atraem.Se os pescadores vão matando as cagarras-de-Cabo Verde em todos os Outubros, no dia-a-dia tentam também capturar outra ave da ilha, a calhandra (espécie de cotovia), que, segundo os dois responsáveis, é "a ave mais rara do mundo"."Em 2004 havia no ilhéu 250 calhandras, no ano passado 72 e este ano 18", diz José Melo, acrescentando que por se tratar de uma ave dócil é capturada viva e vendida para viver em cativeiro.A calhandra é uma ave única no mundo, que só voa a 10 metros de altura e não consegue voar mais do que 30 metros de comprimento, pelo que está confinada ao ilhéu Raso."Todo o ilhéu Raso tem um endemismo fabuloso. E só estamos a falar da fauna, porque em termos de flora é também riquíssimo", conta José Melo.A cagarra-de-Cabo Verde é única no mundo e começou a ser morta na década de 40, para suprir os efeitos da fome que então assolava o arquipélago."Hoje é apanhada para ser vendida nos restaurantes de Santo Antão, como prato típico", conta José Melo, frisando que são aproveitados 55 a 60 gramas de carne, ao custo de dois euros, o mesmo preço de um quilo de frango.O ilhéu Raso, entre Santa Luzia e São Nicolau, tem menos de sete mil metros quadrados e é fácil de proteger "porque a matança ocorre apenas 15 dias por ano", só falta "vontade política", dizem os dois responsáveis.Este ano, a 04 de Outubro, o jornal O Liberal alertava que no dia seguinte iriam começar a sair botes de Sinagoga (Santo Antão) para irem, em alguns dias, "esvaziar os ninhos das indefesas aves que antigamente abundavam em Cabo Verde", acrescentando: "Os departamentos do Estado com responsabilidade na matéria, vão, este ano, ainda a tempo de evitar mais este atentado contra a escassa vida selvagem do país."A Biosfera I tem procurado sensibilizar as populações para o perigo que as aves correm, com palestras em liceus e exposições como a da Cidade da Praia.A associação foi criada no ano passado, no seguimento de uma feira ambientalista (Ecofeira 2006), no Mindelo, que reuniu biólogos e naturalistas e que se destinou a chamar a atenção para os problemas ambientais de Cabo Verde, país onde também todos os anos são capturadas e mortas centenas de uma espécie de tartaruga em vias de extinção.
José Melo e Tommy Melo querem agora levar a exposição sobre o abate de cagarras a Lisboa.
No mundo existem três espécies de cagarras, aves migratórias de longa distância, que passam a maior parte do tempo voando sobre o oceano e só vão a terra para se reproduzir.
Fonte: Agência Lusa
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